Escrever sobre mindfulness quando já vários artigos (em revistas científicas ou de divulgação comercial) e livros foram lançados sobre o tema, e quando existem diversos cursos e retiros organizados por diferentes profissionais, constitui um desafio.
Mais do que escrever, falar ou teorizar sobre mindfulness, para sabermos do que se trata e o que pode fazer pelas nossas vidas, importa experienciá-lo e praticá-lo. Por mais que diferentes autores escrevam sobre o seu percurso e processo pessoal pela via do mindfulness, o caminho percorrido por quem embarque na viagem da meditação mindfulness é único. Um bom facilitador, instrutor ou professor de mindfulness ajuda, somente, a fazer esse caminho, levantando questões e suscitando reflexões.
Porém, falar de mindfulness implica focar a definição de John Kabat Zinn (2005), autor do programa de redução de stresse de oito semanas, amplamente conhecido e divulgado mundialmente, o Mindfulness Based Stress Reduction (MBSR): prestar atenção de uma forma particular, com um propósito, no momento presente, sem julgar.
Como a definição clarifica, o mindfulness pode ser encarado como um traço ou tendência (que a pessoa já possui) ou uma competência que se pode treinar, e que passa por ser capaz de prestar atenção ao momento presente, com intencionalidade, e mantendo uma atitude de abertura, curiosidade e paciência, sem ajuizar o que quer que aconteça ou surja (pensamentos, emoções, sensações internas e/ou externas), enquanto se mantém essa atenção. John Kabat Zinn propôs, no seu programa, diferentes exercícios e práticas formais e informais que permitem realizar este treino. Depois do programa de oito semanas importa manter os exercícios e práticas para que o impacto da meditação mindfulness se faça sentir.
Porquê praticar mindfulness?
A maioria de nós funciona “quase sempre” em piloto automático e sob o comando do “modo fazer”. Este leva-nos, constantemente, ao notarmos discrepância entre o que está a acontecer na nossa vida e o que desejávamos que acontecesse, a tentar resolver esta discrepância e a tentar alcançar mais e mais “coisas”. Muito do sofrimento daqueles que vivenciam depressão e quadros de ansiedade marcados deve-se ao facto de ficarem “presos” ao passado (e.g., tudo o que aconteceu de mal ou não aconteceu) ou darem por si a projectar demasiado no futuro (e.g., tudo o que pode acontecer de mal…).
Prestar atenção ao momento presente, com intenção, curiosidade, paciência e sem julgar, pode ajudar-nos a aumentar o nosso bem-estar e qualidade de vida, a reduzir os níveis de ansiedade e stresse, a diminuir a probabilidade de deprimirmos e de entrar em burnout, para além de nos ajudar a manter relações e comportamentos mais funcionais.
Uma mudança de vida
Treinar o “estar mindful” permite aumentar ou “fazer surgir” a consciência do “lugar” para onde a mente foi (como uma espiral de pensamentos negativos sobre o passado), somente por termos ouvido, por exemplo, uma música triste. Com a consciência desse “vaguear” da mente, que se associa a estados emocionais e a sensações corporais, várias vezes desagradáveis, aprendemos a relacionarmo-nos de uma maneira diferente com a mente, a sair do piloto automático e do “modo fazer”. Aumentamos a nossa capacidade de não responder impulsivamente ao que está acontecer.
Através das atitudes essenciais do mindfulness (aceitação, não ajuizar, paciência, mente de principiante, confiança, não-lutar e deixar ir), da disciplina face à prática, mantendo as atitudes de bondade e auto-compaixão, aprendemos a reconhecer o que está a acontecer no momento presente, a não reagir automaticamente e a optar, com maior consciência, por responder de forma consciente. Esta constitui uma mudança radical, porque passamos a ver verdadeiramente e com clareza, a nós próprios, aos outros e à vida (em toda a sua riqueza) que se desenrola momento a momento…
Mariana Vaz Marques